31-03-2017
O CARTÃO DO MUNÍCIPE ENQUANTO PILAR DA CIDADANIA
O Cartão do Cidadão é uma das ferramentas de boa governação local que os decisores não podem ignorar. Fácil de implementar e com resultados práticos visíveis, aproxima políticos e cidadãos, através de processos interativos de avaliação das políticas locais e da atribuição de benefícios. Saiba como.
Já imaginou uma cidade, vila ou aldeia em que os cidadãos pudessem dispor de uma ferramenta, física ou virtual, que lhes permitisse aceder a vários serviços, agilizar o atendimento e proporcionasse aos serviços públicos a recolha permanente de dados, para que a autarquia possa facilitar a vida do cidadão e, simultaneamente, monitorizar o funcionamento dos seus serviços com vista à sua melhoria? Essa realidade, além de possível, está bem próxima do que seria de supor. O Cartão do Munícipe pode estar associado a um determinado serviço, ou à globalidade da oferta municipal, permitindo à autarquia saber quais os fluxos de procura e quais os benefícios que cada cidadão ou entidade obtiveram.
Além da identificação, o Cartão do Munícipe pode incluir informação acerca da morada do beneficiário, quais as habilitações literárias, os hábitos de consumo, com que frequência utiliza os serviços de saúde e quais, a situação económica e o agregado familiar. Quanto aos campos de utilização, facilita o atendimento presencial e online, o acesso a bens, serviços e equipamentos públicos, a consulta rápida do historial de processos, submissão de formulários ou o acesso a benefícios temporários ou descontos especiais ? para determinados grupos etários ou durante uma determinada época do ano, com facilidades no acesso aos serviços de saúde, de fornecimento de energia ou água, espetáculos culturais ou desportivos, etc.
Este é o caso concreto da Câmara Municipal de Serpa, que lançou o "Cartão Municipal Terra Forte" destinado aos munícipes locais, de facilidade de acesso aos diferentes serviços disponibilizados pela autarquia. O objetivo é, garante o município, tornar "mais célere ao atendimento ao público" e reduzir a burocracia. Como contrapartida pela adesão, os serviços municipais oferecem condições especiais no acesso aos serviços culturais, recreativos e desportivos, nomeadamente o Cineteatro Municipal de Serpa, o Cineteatro Maria Lamas e três piscinas municipais.
Em Serpa, como em Cabeceiras de Basto, os decisores políticos locais quiseram tornar os serviços municipais mais eficazes no atendimento e menos burocráticos. Os cidadãos ganharam em troca acesso facilitado a serviços culturais, desportivos, etc.
Já em Cabeceiras de Basto, está disponível um cartão similar, destinado aos munícipes residentes e não residentes (que tenham, ou venham a ter, processos a tratar localmente) do concelho, tendo em vista facilitar a resolução de processos burocráticos. Ao apresentar o cartão nos serviços municipais, torna-se mais eficaz o acesso personalizado aos processos e aos portais de serviços web, bem como simplifica a identificação aquando da entrada de qualquer requerimento nos serviços municipais.
Se o lançamento de cartões de forma individualizada por parte das autarquias pode trazer benefícios geograficamente muito localizados, a criação de serviços comuns a vários municípios terá um impacto muito mais significativo. É o caso do Ajuntamento de Palma, em Espanha, cujo Cartão do Munícipe envolve 25 autarquias. Conforme é explicado no portal do Ajuntamento, o cartão serve para beneficiar de serviços tão distintos como pagar os serviços de transportes coletivos de Palma, com tarifas ilimitadas e sem necessidade de dinheiro na aquisição, obtenção de certificado de residência para viagens ou até para usufruir dos serviços de aluguer de bicicletas.
O Ajuntamento de Palma (Espanha) optou por incluir no Cartão de Cidadão facilidades como o pagamento dos serviços coletivos de transporte sem necessidade de dinheiro físico. No Canadá, o foco foi a comunidade emigrante...
Com a criação de um Cartão de Cidadão, as autarquias podem ainda gerar benefícios muito importantes para o comércio local, através de programas de desconto nas aquisições de bens ou de serviços dos munícipes nas lojas. Na prática, os titulares do Cartão de Cidadão poderiam, por exemplo, beneficiar de descontos impactantes (30, 40 ou 50 por cento) em determinadas horas, ou para determinados produtos/serviços, impulsionando assim os hábitos de consumo dos munícipes e criando riqueza direta para os comerciantes.
No Canadá, a municipalidade de New Haven desenvolveu um cartão com valências ligeiramente diferentes, mas que de igual modo contribuem para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, mais concretamente da comunidade emigrante. Sabendo os responsáveis políticos locais que, muitas vezes, os emigrantes sentem dificuldade no acesso a serviços básicos (e não só), em grande medida por não terem documentos de identificação, lançaram um cartão que lhes permite beneficiar de serviços como, por exemplo, ir a uma farmácia aviar uma receita, abrir e fechar um conta bancária local ou obter um cartão de biblioteca. Além disso, disponibiliza informação acerca de aspetos como a segurança pública, o acesso a serviços de governação municipal, o conhecimento acerca dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, entre outros.
Na Índia, o desafio foi diferente. A complexidade social de um país com mais de 1,2 mil milhões de habitantes é enorme e só medidas de aplicação cirúrgica têm garantias de sucesso. No final do ano passado, o primeiro-ministro Narendra Modi anunciou o final das notas de 500 e de 1000 rupias, rumo a uma "cashless" Índia, ou seja, de uma economia com o mínimo de dinheiro circulante possível. Nesse sentido, as autoridades locais desenvolveram um cartão "inteligente" único, que funcionará como meio de pagamento de serviços, bem como para permitir o acesso a vários serviços fornecidos pelas duas principais autoridades locais. O cartão pode ser usado para pagar impostos, licenças comerciais, de publicidade, de habitabilidade, taxas de estacionamento, coimas impostas pelas autoridades locais e nacionais, entre muitos outros.
Com uma faixa importante da população (menores de 16 anos) de fora das estatísticas, o "mayor" de Nova Iorque apresentou um cartão que, além de reunir informação relevante sobre este grupo, lhe concedeu inúmeros benefícios em troca.
As aplicações práticas do Cartão do Cidadãos são inúmeras e só estão dependentes das necessidades de cada comunidade e da vontade política dos decisores. Em Nova Iorque (Estados Unidos da América), foi criado um documento de identificação destinado a abranger uma franja da sociedade até então excluída dos benefícios proporcionados pelos serviços municipais. O IDNYC não só permitiu incluir na base de dados municipal os cidadãos com menos de 16 anos (não possuem carta de condução, documento primordial), como proporcionar-lhes a facilidade de acesso às 33 principais instituições culturais da cidade museus, centros de arte, salas de concerto, jardins botânicos, zoos, etc...
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