28-11-2016
SOLUÇÕES DIGITAIS NO COMBATE AO DESPERDÍCIO ALIMENTAR
O desperdício alimentar é um dos graves problemas das sociedades modernas, gerando sérios problemas económicos, sociais e de sustentabilidade ambiental. Apostar em soluções de base tecnológica que envolvam cidadãos, empresas e organizações não-governamentais é o caminho do futuro.
Se o desperdício alimentar fosse convertido num país, seria o terceiro a nível mundial em termos de emissão de gases poluentes, atrás dos Estados Unidos da América e da China, segundo as Nações Unidas (http://www.fao.org). Nos atuais tempos de crise económica e social, o desperdício alimentar é um problema sério das sociedades modernas. Na União Europeia, calcula-se que mais de 89 milhões de toneladas de alimentos são simplesmente deitados ao lixo por ano ? em Portugal, os valores andam na ordem do milhão de toneladas, situação idêntica à que se verifica com os chamados monstros ou monos (mobílias e todos os resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos), que diariamente são atirados para os depósitos municipais ou deixados ao abandono. Combinadas, estas duas situações geram graves problemas de sustentabilidade económica e social, que se refletem também ao nível ambiental.
Importa, por isso, enfrentar estes constrangimentos como uma oportunidade para saber conciliar os recursos tecnológicos existentes com as políticas existentes, de forma a ajudar a combater os problemas e a tornar possível uma sociedade que combata o desperdício, promova uma alimentação acessível a todos à escala global e preserve o meio ambiente. Para atingir estes objetivos, é fundamental criar e implementar soluções tecnológicas para abordar o problema e envolver a comunidade sobre fatores e recursos potencialmente não aproveitados.
As autarquias locais são as primeiras entidades a poder contribuir para o combate ao desperdício, já que são elas quem mais perto está dos cidadãos, logo, melhor os pode sensibilizar e mobilizar. Mas não só. O envolvimento pode ir mais longe, se forem englobadas comunidades locais, programas governamentais de combate ao desperdício alimentar, cadeias de distribuição e venda de alimentos, indústria hoteleira (restaurantes, empresas de catering), hospitais, empresas de recolha de resíduos, agricultores, escolas (do ensino básico até às universidades) e famílias.
A criação de soluções tecnológicas é decisiva para enfrentar o problema do desperdício alimentar. Para resolver esta equação, devem estar envolvidas autarquias, empresas de venda e distribuição de alimentos, restaurantes, unidades de saúde, agricultores, estabelecimentos de ensino, etc.
As soluções para o futuro do combate ao desperdício alimentar devem garantir, ao mesmo tempo, a saúde e o bem-estar das pessoas, a sustentabilidade ambiental e a igualdade no acesso à alimentação, devendo ainda potenciar o desenvolvimento económico através da criação de valor acrescentado e de emprego. É também importante investir numa cadeia de proximidade entre o produtor e o consumidor, através de incentivos ao comércio local e a mercados como alternativas à grande distribuição.
A principal componente deste projeto é a comunicação. Neste contexto, as iniciativas de base passam por: criar e informatizar os programas de responsabilidade social dos municípios, desenvolver a infraestrutura de marketing digital (base tecnológica de gestão e edição de conteúdos, designers e redes sociais) para de seguida criar o plano de marketing digital para captação de cidadãos voluntários e definir os programas e as políticas de premeio e de distribuição de benefícios junto dos mesmos; por fim, criar o dashboard online de monitorização em tempo real do marketing digital.
A informatização dos programas de responsabilidade social das autarquias, o desenvolvimento de infraestruturas de marketing digital e a criação de bolsas de voluntariado são algumas das medidas a implementar, no sentido de gerar valor acrescentado e emprego.
Exemplos de sucesso no combate ao desperdício abundam um pouco por todo o lado e o caso de Austin (Texas, EUA) é paradigmático. Com uma simples aplicação digital, os utilizadores apenas têm de declarar se dispõem de alimentos que podem ser consumidos e logo um voluntário é avisado desta situação, recolhe-os e entrega-os a instituições previamente definidas. O processo é melhorado com a intervenção de uma empresa de entregas, cujos motoristas foram também incluídos neste programa de voluntariado. Há um elemento-chave que importa salientar: cada voluntário acumula pontos pelo seu trabalho de caridade numa espécie de bolsa, sendo todas as transações visíveis para qualquer elemento da organização, fomentando assim um sentimento de ajuda à comunidade: para que este processo funcione com sucesso basta utilizar uma aplicação funcional em dispositivos móveis.
Neste processo, além da criação de bolsas de cidadãos voluntários, de uma rede de pontos de recolha de bens perecíveis e não perecíveis (para fazer face ao desperdício de monos), foi necessário também construir uma base de dados que incluísse a rede de munícipes mais necessitados. Foi nesta rede de parceiros que entraram empresas locais, organizações não-governamentais, instituições de cariz religioso e instituições de solidariedade social de vária ordem, já que são estas quem na maior parte das vezes organiza Feiras Sociais onde os alimentos podem ser distribuídos.
As bases de dados que informem acerca das pessoas mais carenciadas devem estar acessíveis a empresas locais, organizações não governamentais, instituições de cariz religioso e instituições de solidariedade social de vária ordem.
No caso da bolsa de voluntários, cite-se aqui o exemplo do Movimento Refood (http://www.re-food.org/pt), que encontrou uma fórmula simples e eficaz para compensar o grupo de voluntários que participa no projeto: cada elemento incluído no trabalho passa automaticamente a ser também beneficiário. O Movimento nasceu em 2011 com um voluntário numa bicicleta a recolher alimentos de 30 restaurantes num dia, alimentava cerca de 50 pessoas com necessidades, cinco dias por semana. Após cinco anos, existem 25 núcleos Refood em todo o país, onde mais de 4.000 voluntários resgatam 46.000 refeições por mês a partir de mais de 900 parceiros de fontes de alimentos (restaurantes, supermercados e agricultores) e servem 2.500 pessoas.
De volta ao território dos EUA, a organização Spoiler Alert (www.foodspoileralert.com) dirige a sua atividade aos grandes produtores e distribuidores: através de uma plataforma digital de alerta, as notificações são feitas em tempo real e os alimentos são de imediato recolhidos. Para incentivar as doações, a aplicação vem equipada com um sistema métrico que mostra aos utilizadores potenciais benefícios fiscais, como seja uma lista de organizações não- governamentais às quais podem ser feitos os donativos.
Ao nível da União Europeia, há medidas já em curso. De acordo com um documento emitido pela Comissão dos Recursos Naturais, a Comissão Europeia (http://ec.europa.eu/index_en.htm) propõe a criação de uma plataforma dedicada ao desperdício alimentar, envolvendo os Estados-membros e todos os intervenientes na cadeia alimentar. O objetivo da plataforma é, até 2025, apoiar a realização da meta de redução do desperdício alimentar, facilitar a cooperação e a partilha de boas práticas.
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